Horta, Faial - dos hidroaviões aos dragoeiros
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Horta, Faial - dos hidroaviões aos dragoeiros



Panorâmica da cidade de Horta
         Horta é uma cidade intrigante. No passado teve uma alta importância estratégica devido ao porto excelente e à sua localização nos Açores, na mais ocidental das ilhas do centro do arquipélago. Sua denominação provavelmente deriva do sobrenome de Josse Van Huertere, o nobre flamengo que liderou a primeira leva de colonização da ilha do Faial em 1468, se estabelecendo no vizinho Vale dos Flamengos.

O hall do ótimo Hotel do Canal, homenageando os hidroaviões da PanAm que faziam escala na marina de Horta

         Horta foi promovida a cidade em 1833 por D.Pedro IV,  o nosso D. Pedro I, pelo apoio à causa liberal na luta do ex-imperador do Brasil contra o irmão D. Miguel pelo trono de Portugal (após a abdicação em favor do filho no Rio, D. Pedro I se exilou nos Açores para planejar a retomada do trono em Lisboa). Com a inauguração do porto em 1876, se converteu em parada estratégica das embarcações que cruzavam o Atlântico, além de se tornar um dos mais importantes ancoradouros de barcos de caça à baleia. No final da década de 20, foi escolhida como escala para os hidroaviões que faziam os voos entre Estados Unidos e Europa, sendo ainda o ponto onde os cabos submarinos emergiam à terra na conexão entre os dois continentes. O controle de todas as atividades exigia a presença de funcionários de companhias aéreas e telegráficas, e a cidade era uma babel cosmopolita de ingleses, americanos, franceses e alemães. De todos estes serviços do passado, só sobraram as atividades da marina, ainda bastante movimentada, sendo a caça às baleias extinta na década de 70.

A marina de Horta com o morro da Espalamaca ao fundo
         Hoje, a maior parte dos seus habitantes trabalha para o governo, já que a sede do Parlamento açoriano e algumas de suas secretarias se situam aqui. A sua arquitetura mistura prédios históricos em construção típica portuguesa – principalmente igrejas -  e algumas casas com fachadas trabalhadas, pintadas em tons pastéis como verde ou rosa, pertencentes às famílias abastadas da época. Vários destes prédios foram erigidos pela família americana Dabney, bastante influente na cidade no século XIX, à época sede do consulado americano.

O Peter Café Sport, o bar mais famoso dos Açores
          A sua marina chama a atenção, com fama lendária e repleta de embarcações que fazem escala na ilha antes de seguir viagem oceano adentro. Em ambas as Guerras Mundiais, Horta foi uma importante base naval para as forças aliadas, tendo inclusive abrigado a frota invasora da Normandia. O Peter Café é um bar fumacento existente há quase cem anos e famoso como ponto de encontro dos marinheiros, sendo hoje um símbolo e orgulho para os faialenses. A rua fronteira ao bar e à marina leva o nome de seu fundador, apelidado de Peter.  No andar superior funciona o Museu do Scrimshaw, montado pelo fundador do bar e mantido por seus descendentes com centenas de exemplares de scrimshaws, desenhos feitos em ossos e dentes de baleia por marinheiros para passar o tempo nas longas jornadas. Uma outra atração relacionada aos marinheiros são os desenhos que cobrem a murada ao longo de toda a marina, feitos pelos próprios viajantes. A promenade que acompanha a marina oferece ainda vistas da fronteira Ilha do Pico, com o majestoso Pico propriamente dito, normalmente encoberto por nuvens no seu cume.

O histórico Porto Pim, com o Portão do Mar, fortificado

           Passear pela cidade de 8.000 habitantes é uma experiência sui-generis e agradável. A impressão que tive é que a cidade meio que parou no tempo, parecendo uma cidade do interior do Brasil de cinquenta anos atrás. Nada é ostensivo na paisagem. Não existem edifícios de mais de quatro andares e se veem poucas pessoas nas ruas com limpeza impecável. As lojas têm entradas modestas, sem propagandas chamativas. Poluição, é claro, nem sinal!

A Praia do Porto Pim, com a antiga fábrica de desmanche de baleias

          O bairro de Porto Pim, originalmente um outro núcleo que se fundiu a Horta, aparenta ser ainda mais antigo, com duas edificações do século XVII voltadas para a defesa da povoação, o Forte de São Sebastião e o Portão do Mar.  Sua praia de areia escura tem uma aparência ainda selvagem, acabando em um prédio histórico que era a fábrica de desmanche de baleias e que hoje sedia o Centro do Mar. Neste museu estão conservadas as máquinas de onde se extraíam o óleo e a farinha derivadas do pobre cetáceo, e há um vídeo mostrando como era a caça. A fábrica, inaugurada na década de 40, foi fechada trinta anos depois e hoje felizmente a única atividade relacionada a baleias é a excursão para seu avistamento, também disponível nas demais ilhas. Após a visita à antiga fábrica, vale a pena contornar o prédio e apreciar a vista de Porto Pim obtida dos fundos da construção.
         
O Forte de Santa Cruz

O antigo Colégio dos Jesuítas, hoje abrigando o Museu da Horta e a Igreja Matriz

         Dentre as construções em Horta que chamam a atenção se sobressaem o Forte de Santa Cruz, erigido no século XVI para defesa da cidade e que hoje sedia um hotel de luxo; o Convento de São Francisco; e o antigo Colégio de Jesuítas, situado na rua principal, que abriga a Igreja Matriz, o Museu de Horta e repartições do governo - o Museu de Horta contém uma exposição sobre aspectos históricos do Faial, como a erupção que devastou a ilha em 1957 detalhada no último post e também trabalhos em miolo de figueira.

A Torre do Relógio

          Na ponta da cidade encontramos a solitária Torre do Relógio, única parte remanescente da igreja matriz original que sucumbiu a um terremoto.  Em frente à Torre, o Jardim Florêncio Torres impressiona com alguns exemplares de dragoeiro, a imponente e exótica árvore típica da Macaronésia que lembra um guarda-sol, ameaçada de extinção. Sua seiva, por ser vermelha e escura, dá a impressão de a árvore sangrar, tendo sido usada no passado como tintura e tônico medicinal. A origem do seu nome está relacionada à mitologia grega: em um dos seus trabalhos no Jardim das Hespérides, Hércules teria matado um dragão; o sangue da besta jorrado no solo teria originado o primeiro dragoeiro.

Exemplar de dragoeiro, árvore típica dos Açores e das Canárias

         Finalmente, uma curiosidade: a brigada de incêndio de Horta é inteiramente composta por voluntários, muitas vezes uma tradição nas famílias há gerações. Considerando que os bombeiros são também responsáveis por salvamentos, não deixa de ser um dado interessante para uma ilha tão sujeita a terremotos e catástrofes vulcânicas.

         No próximo post, rumamos para a segunda ilha açoriana – Pico.

* Este é o terceiro da série de sete posts sobre os Açores, Portugal  .Para visualizar os demais acesse: Açores, um paraíso perdido no Atlântico.



  Postado por  Marcelo Schor  em 26.07.2012  



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