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O restaurante em Wildkirchli, na encosta do monte Ebenalp |
Quando escolhi Appenzell (mostrada no último post) como um destino da minha viagem mais recente à Suíça, comecei a pesquisar qual dos mirantes nos seus arredores iria visitar. Estava em dúvida entre o Säntis, o mais alto e conhecido, com 2.500 metros de altitude, e o Ebenalp. Ambos são acessados da mesma forma, por teleféricos situados em parada de ferrovia. Foi então que ao pesquisar na internet sobre o Ebenalp, me deparei com o cenário da foto acima. O interesse foi imediato. Que restaurante era esse praticamente encravado na rocha? Quando descobri que ainda por cima lá era servida uma batata rösti considerada entre as melhores da Suíça, me bateu a certeza: eu tinha que conhecer esse lugar.
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Wasserauen e o prédio da estação ferroviária vistos no início da subida do teleférico |
Chegar ao Ebenalp partindo de Appenzell é muito fácil. O trem leva somente onze minutos até Wasserauen, ponto final da linha e onde se inicia o teleférico. Os trens que vão a Appenzell muitas vezes prosseguem até Wasserauen, portanto para aqueles que como eu vêm de Zurique, nem é necessário parar em Appenzell. E foi o que fiz, segui direto para o Ebenalp e soltei em Appenzell apenas no retorno, já à tarde.
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O teleférico rumo ao topo do Ebenalp |
A estação inicial do teleférico fica a poucos metros da estação ferroviária de Wasserauen. Os dois terminais estão localizadas num vale fluvial estreito e verdejante com gado pastando, naquele cenário rural típico suíço. No teleférico o portador do Swiss Pass tem 50% de desconto - paguei 14 francos pela ida e volta. A subida pelo teleférico até o Ebenalp é bem rápida, e a paisagem maravilhosa começa a se descortinar já quando o bondinho vai subindo acompanhando a encosta.
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Os saltadores e seus parapentes no platô junto ao terminal do Ebenalp |
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Os parapentes flanando pelo vale |
O Ebenalp está situado a 1.640 m, uma altitude que pode até ser considerada baixa quando comparada com os demais mirantes alpinos espalhados pela Suíça, mas a paisagem não deixa nada a desejar em relação aos demais observatórios - montanhas nevadas e sem neve, muito verde e lagos abaixo, sempre respirando um ar puríssimo. Um diferencial é a utilização do platô gramado junto ao terminal do teleférico no alto da montanha como plataforma de salto de parapentes. Apreciar os voos dos parapentes varando o ar em meio àquele cenário deslumbrante é diversão garantida.
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A trilha que sai do Ebenalp rumo ao Säntis |
Voltando ao meu objeto de procura, o restaurante, sabia que ele se encontrava após uma caverna, a Wildkirchli, a qual se alcançava após 12 minutos de caminhada por trilha desde o terminal. Não reparei nesse nome que estava escrito em letras menores numa placa bem na saída e já fui caminhando pela trilha principal, que circunda o prédio maior no alto do morro (que também abriga um restaurante), passa pelo "aeroporto" de parapentes, e segue seu trajeto pela montanha. O cenário ao longo da trilha é lindo, e ela é utilizada por caminhantes que, mochila nas costas, se dirigem ao próprio Säntis, a cinco horas de distância, ou ao Seealpsee, um lago de um verde esmeralda no vale abaixo que descortinamos do alto do Ebenalp, situado a uma hora de descida íngreme.
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O lago Seealpsee |
Após uma caminhada de vinte minutos numa temperatura de uns 15 °C e muitas fotos para tudo que é lado, cheguei à brilhante conclusão que estava na direção errada se queria comer a famigerada rösti. Voltei ao terminal e aí vi os dizeres da placa, apontando para baixo e mencionando a "distância" de doze minutos, por uma trilha com escadas que desciam a encosta seguindo mais ou menos o trajeto do teleférico. Iniciei a nova caminhada e fui descendo centenas de degraus. Depois de vários minutos, comecei a duvidar se era por ali mesmo e confesso que cheguei a pensar em desistir - afinal, depois teria que subir aqueles degraus todos novamente. A vontade de tirar a foto que tinha visto no computador e minha "batatolatria" me impeliram a continuar descendo. Numa bifurcação questionei algumas pessoas que estavam voltando pela trilha da direita; sim, estava no caminho certo. Após mais minutos em descida, apareceu uma roleta no meio do caminho. Passando-a, finalmente descortinei a entrada da caverna de Wildkirchli, a uma altitude 200 metros inferior ao topo do Ebenalp. Levei algo mais que os propalados 12 minutos de caminhada.
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A entrada da caverna de Wildkirchli |
A caverna é uma história à parte. Trata-se de uma caverna pré-histórica, habitada no passado por neandertais. O problema para atravessá-la é que não há iluminação para te guiar. O trajeto dentro da caverna, sempre em descida, é feito unicamente com a luz natural vinda das duas aberturas nas extremidades. Como a caverna tem uma extensão de dezenas de metros, o seu meio é um breu total. Ainda por cima o solo é escorregadio e o jeito é ir tateando o chão com o calçado e, com a ajuda do corrimão, ir avançando aos poucos na descida. Após alguns minutos, cheguei ao outro lado da caverna, cuja abertura abriga uma cabana de madeira habitada por monges eremitas nos séculos passados (o último, já no século XIX, teve um final trágico: caiu no precipício e morreu). A cabana hoje sedia um pequeno museu.
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A cabana na saída da caverna (que está à esquerda) - fonte:wikimedia commons |
Logo após a cabana, passei por uma capela construída numa abertura na rocha e que dá nome ao lugar (Wildkirchli em alemão suíço significa algo como "igrejinha selvagem"). Andando mais alguns metros pela trilha, e agora realmente beirando o precipício, cheguei finalmente ao restaurante Berggasthaus Aescher. Creio que nem preciso descrever, a foto abaixo já mostra o quadro que realmente parece saído de um conto de fadas, com o prédio de madeira debruçado sobre o vale, meio encravado e apequenado pela montanha que o envolve.
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Finalmente, o restaurante Aescher |
O restaurante também é uma hospedaria e ocupa a construção erguida há mais de 170 anos. Originalmente tinha a função de abrigar os peregrinos que vinham se aconselhar com os monges. Fiquei a imaginar como é o pernoite naquele lugar maravilhoso, vislumbrando uma noite estrelada. Por sinal, há diversas Berggasthäuse na região montanhosa de Appenzell, que servem de apoio aos caminhantes. Cada uma destas hospedarias está a um dia de distância de caminhada em relação à outra.
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Vista a partir do pátio do restaurante Aescher |
Quando cheguei, o pátio com as mesas sob os guarda-sóis com vista soberba para as montanhas estava completamente cheio - eram 12:15 de um domingo - e, ô sorte, peguei o último lugar vago. Dando vazão à minha gula, devidamente exacerbada pelo exercício da caminhada, pedi logo a batata rösti. A atendente em traje típico suíço ainda perguntou "Mas você só quer a rösti? Não quer carne ou ovo acompanhando?", recebendo uma resposta negativa. Rezam as receitas que a melhor forma de preparar o prato é cozinhar a batata na véspera e colocá-la na geladeira por um dia; retirada de lá, a batata é jogada então numa frigideira quente com manteiga, sendo então cortada e frita até dourar.
Terminada a refeição, saciado e satisfeito com a missão cumprida, refiz o caminho todo de subida até o terminal para pegar o teleférico de volta a Wasserauen. Desta vez, a passagem pela caverna foi mais rápida, já que o perigo do escorregão diminui bastante na subida.
Se gostei da batata rösti? Sem sombra de dúvida a melhor que já saboreei até hoje.
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A batata rösti do Aescher |
Cidade em que me hospedei: Zurique
Acesso ao Ebenalp: a partir de Appenzell por trem até Wasserauen, com teleférico em seguida.
Transporte pelo Swiss Pass: Coberto até Wasserauen. O teleférico tem desconto de 50% com a apresentação do passe.
Com este lugar fora de série, encerro a primeira parte dos relatos sobre a Suíça. Antes de voltar a falar do país alpino, vou mostrar a partir do próximo post as belezas de uma das ilhas mais fantásticas do Mediterrâneo - Malta.
* Este é o sexto post da série sobre a Suíça. Para visualizar os demais, acesse A saborosa Suíça. Postado por Marcelo Schor em 20.08.2014
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