Zadar, porta de entrada da Dalmácia
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Zadar, porta de entrada da Dalmácia



O Fórum de Zadar com a Igreja circular de São Donato e a torre da Catedral

        Quando deixamos Opatija rumo a Zadar, nosso motorista optou por utilizar as excelentes autoestradas croatas de pista dupla do interior com cobrança de pedágio, evitando a estrada litorânea, apesar das duas cidades serem banhadas pelo Adriático. A rota pela costa seria mais demorada, devido à estrada mais congestionada, estreita e tortuosa, já que o litoral da Croácia é extremamente recortado.

Os campos do interior da Croácia
Os picos dos Alpes Dináricos

          O que me impressionou foi a modificação progressiva da paisagem durante o trajeto de três horas. Após subir a serra que cerca Opatija, entramos num planalto e passamos por uma sucessão de campos verdejantes com plantações variadas. Logo a moderna estrada  inaugurada há alguns anos passa a ladear os Alpes Dináricos, uma cadeia de montanhas que atravessa a Península Balcânica paralela ao litoral desde a Eslovênia até a Albânia. A travessia dos Alpes foi feita por dois túneis de seis quilômetros de extensão. Do outro lado do último túnel, a paisagem da descida rumo ao litoral se torna cada vez mais desértica até chegarmos a Zadar - basta acompanhar a sucessão de fotos tiradas da janela do ônibus para perceber o ressecamento progressivo da paisagem.

A paisagem do litoral norte da Dalmácia
Reentrância do litoral junto a Zadar

       Zadar já pertence à região da Dalmácia, tendo sido inclusive sua capital, posto hoje ocupado por Split. Com um aeroporto recebendo voos oriundos de diversas cidades europeias, Zadar se tornou uma das portas de entrada para as atrações turísticas da costa croata. Além disso, é um dos dois pontos de partida principais para quem deseja conhecer os Lagos Plitvice em passeio de um dia; o outro é a capital Zagreb.

        Situada numa península, a origem de Zadar (ou Zara, seu nome italiano) remonta à época romana, e ao se passear pelas ruas antigas na cidade histórica é comum nos depararmos com uma coluna romana plantada no meio da rua. 

Vista aérea da península de Zadar - fonte:croatia.hr
         
           A cidade antiga de Zadar ainda tem as muralhas que a circundavam parcialmente preservadas e o seu portão principal na época também ainda existe: é o Portão da Terra, assim nomeado por estar situado na comunicação da península com o continente, na parte superior e mais afastada da foto acima. O belo Portão, inaugurado em 1543, é encimado pelo Leão de Veneza, mostrando o domínio dos venezianos em toda a Dalmácia por séculos a fio desde 1409 até a região cair sob o domínio austro-húngaro no século XIX. O Portão ainda possui um toque macabro: oito caveiras de boi dispostas acima do leão que visavam afugentar invasores (será que alguém caía nessa?). A visão do Portão por fora é complementada pela Foša, um pequeno canal ao seu lado que originalmente alimentava o fosso da muralha e hoje sedia uma marina.

O Portão da Terra

A Fosa e o trecho das muralhas contíguo ao Portão

           Os monumentos históricos de Zadar estão dispostos ao redor de três praças: a mais antiga é a do Fórum, onde se situava o mercado romano, restando ainda algumas poucas colunas parciais e pedras. De maior interesse na praça é a Igreja de São Donato, erguida no século IX sobre o antigo fórum aproveitando algumas de suas colunas, e a Catedral de Santa Anastásia. A Igreja de São Donato, que chama a atenção pelo seu formato circular, tem uma acústica excepcional e não sendo mais usada como templo, sedia concertos à noite.

A Praça do Povo e a Torre da Guarda

           Das duas outras praças, a do Povo (Narodni Trg) é o ponto de encontro da população da cidade. No seu entorno ficam a Prefeitura, o escritório de turismo e a Torre da Guarda, um edifício de 1562 com seu relógio pontual adicionado dois séculos depois. Finalmente, a Praça dos Cinco Poços, perto do Portão da Terra, faz jus ao nome e possui poços alinhados que serviam à população medieval para o abastecimento de água. A Torre do Capitão que compartilha a praça com os poços era usada na vigilância e defesa da cidade contra os invasores. Perto das duas praças se situa a área com casario mais antigo, a Varoš, com ruas estreitas contendo inúmeros pequenos cafés onde estudantes universitários se encontram para bater papo.

           Zadar foi duramente bombardeada no final da Segunda Guerra Mundial. Durante a guerra contra a Sérvia na década de 90, esteve sob a iminência de cair nas mãos do inimigo algumas vezes, o que não aconteceu; a cidade porém sofreu diversos ataques da artilharia sérvia posicionada nas cercanias elevadas. Hoje não se nota qualquer resquício destes ataques, mas foi aqui que primeiro vi o pior dano resultante do conflito: no imenso píer que avança pelo mar vislumbrei uma cadeira de rodas vazia e do lado um homem solitário deitado, tomando sol de sunga. O homem não tinha pernas, provável efeito de minas terrestres, um legado da guerra que lamentavelmente é pesadelo comum nos interiores croata e bósnio até os dias de hoje.  
Os cinco poços na praça homônima e a base da Torre do Capitão

           Devido a todos estes acontecimentos, as atrações históricas de Zadar não são tão numerosas quanto as das outras cidades dálmatas que tive a oportunidade de conhecer (aliás, me incomoda um pouco usar a palavra "dálmata" como gentílico - parece que estamos nos referindo à célebre raça de cachorro!). Para compensar, nos últimos anos a cidade se reinventou e investiu em novas atrações na sua orla.  Certamente hoje Zadar é mais famosa por conta destas novidades do que pelas ruínas ou prédios históricos. Infelizmente para mim, a maior destas duas atrações recentes, o Órgão do Mar, estava sem funcionar, em manutenção. Trata-se de um órgão inaugurado em 2005 com apitos e tubos colocados sob a água do mar numa escadaria do cais, que emite sons de acordo com o bater das ondas. Dizem que quanto mais agitadas as ondas, mais bonito o som resultante. Possivelmente a minha ligeira frustração com Zadar tenha tido origem na impossibilidade de apreciar o órgão funcionando, pois estava ansioso para ouvi-lo desde que assisti a uma reportagem sobre o dispositivo num programa da TV alguns meses antes.

O moderno Saudação ao Sol

           A Saudação ao Sol é a outra atração inaugurada recentemente e fica posicionada ao lado do Órgão do Mar bem na quina da península. Ela não estava em manutenção, mas só produz efeitos após o pôr do sol e a essa hora já tínhamos saído de Zadar há muito tempo. É um mecanismo de armazenamento de energia do sol através de 300 placas de vidro com dispositivos fotovoltaicos dispostas em círculo, que à noite liberam esta energia através de luzes coloridas aleatórias. A energia armazenada é tamanha que além das luzes, alimenta também o próprio sistema de iluminação de todo o cais ao redor. O efeito das luzes  parece ser absolutamente fascinante. O conjunto do Órgão do Mar e da Saudação ao Sol fez a fama do pôr do sol na área e as pessoas se estasiam com as sensações auditivas e visuais resultantes. Portanto, a dica para quem resolver incluir Zadar no seu roteiro é chegar à tarde e pernoitar na cidade, aproveitando o espetáculo.

* Este é o quinto post da série sobre os países da extinta Iugoslávia. Para visualizar os demais, acesse  Atravessando os Bálcãs: Croácia, Eslovênia e Bósnia.

 Postado por  Marcelo Schor  em 11.08.2013 




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