A presença e importância do glaciar homónimo da cidade de Ilulissat é tal que é ele que determina a importância turística desta cidade e é por causa dele que a cidade tem o nome que tem (“cidade dos icebergues”). Depois de vários dias passados em Ilulissat, foram diversas as actividades que nos permitiram admirar o fiorde cheio de gelo e os seus icebergues: cruzamos de barco, desde Qasigiannguitt até Ilulissat, passando perto da boca do fiorde (num dia em que o mar estava repleto de gelo), fizemos os treks que exploram uma das margens do fiorde, a sul da cidade, que nos permitiram admirar gigantescos icebergues, e praticamente qualquer caminhada na cidade é dominada pelas vistas do gelo vindo do fiorde.
Mas o glaciar em si, fonte de todo este gelo, permanecia incógnito… A topologia do terreno em redor da cidade impede uma aproximação a pé ao glaciar, enquanto que a quantidade de gelo no fiorde torna impossível uma aproximação de barco, logo a única maneira de se olhar para o glaciar é do ar.
Em Ilulissat existem 2 companhias que fazem voos de avioneta ou helicóptero sobre o glaciar e o fiorde de gelo, sobrevoando também um pouco do manto de gelo que alimenta o glaciar. Tem um preço proibitivo, mas perdemos um pouco a cabeça e resolvemos que tínhamos de encarar o “bicho” de frente, olhos nos olhos.
Era uma oportunidade única e não a podíamos desperdiçar; este afinal é o glaciar que liberta mais gelo fora da Antárctida e é responsável por cerca de 10 % da descarga total para o mar do imenso manto de gelo da Gronelândia.
Levantamos voo do aeroporto de Ilulissat numa pequena avioneta de 6 lugares, acompanhados de um casal de alemães. Rapidamente atravessamos o terreno montanhoso a leste da cidade, outrora coberto de gelo, para conseguirmos observar um belo glaciar vizinho que, no entanto, quase não tem actividade de “
calving” (e que, erroneamente, por estas bandas são denominados glaciares “mortos”).
A seguir sobrevoamos o chamado “
inland ice”, a parte mais interior do manto de gelo, mas que nesta zona, sujeito a elevadas taxas de ablação (fusão e ruptura do gelo), apresenta uma textura rugosa e cheia de
crevasses (fendas), assim como rios e lagos de água cristalina. É pena as fotos não mostrarem por inteiro a magnitude da escala destas formações no gelo…
A avioneta vira então em direcção ao mar e aproximamo-nos da frente do glaciar, enorme quer em altura quer em comprimento. O fiorde aqui está tão repleto de gelo que a água líquida está completamente submersa e podemos ver que recentemente o glaciar não libertou nenhum icebergue das dimensões daqueles que se encontram na boca do fiorde, encalhados na moreia submarina que os trava, antes de se dirigirem para o mar.
A isto talvez não seja alheio o facto de que o glaciar retrocedeu tanto nos últimos 10 anos que, há pouco tempo (1 mês, disse-me o piloto), observou-se rocha por baixo da frente do glaciar, ou seja, no seu retrocesso, a língua de gelo deixou de estar a flutuar em água e está agora a começar a ficar apoiada em rocha. Quando isto acontecer em toda a frente do glaciar, o fenómeno de
calving cessará, e o glaciar sofrerá ablação de outras formas, sem libertar icebergues. Nessa altura, que provavelmente não estará muito longe, a cidade de Ilulissat terá de mudar de nome…
Afinal a oportunidade de ver este glaciar ainda era mais única do que pensávamos: estes podem ser os últimos dias da actividade do glaciar mais produtivo do hemisfério norte.
O voo continuou ao longo do fiorde, sobrevoando o gelo em pó, os icebergues mais ou menos desfeitos, mais ou menos imponentes. Um canal de quilómetros cheio de gelo à superfície até que, na zona de contacto com a baía, estão temporariamente presos os icebergues do tamanho da cidade que lhes deve o nome.
Aqui o avião faz um pequeno desvio à localidade de Ilimanaq, e depois segue em direcção ao aeroporto, passando em frente aos icebergues maiores, sobrevoando em seguida a cidade e finalmente aterrando na pequena pista nos arredores da cidade.
Tal como foi um privilégio sobrevoar e observar do ar o manto de gelo na costa leste e no sul, quando voamos da Islândia para Narsarsuaq, também aqui vivemos um momento único ao observar o gelo tão de perto, mas ao mesmo tempo com a distância suficiente para se ter uma noção da sua beleza e magnitude.
É certo que existem paisagens na Terra que ultrapassam tanto a compreensão humana que, desde tempos imemoriais, foram designadas como a “Morada dos Deuses”. E se é certo que, seres ínfimos e insignificantes como nós não devem ter a pretensão de conhecer os cantos a essas casas, acredito que os deuses não levarão a mal se espreitarmos um pouco pelo buraco da fechadura.
Foi isso que fizemos hoje, e o que vimos é muito, mas muito, mais belo que aquilo que tentei transmitir por palavras e fotografias.
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