Encontro-me a escrever esta crónica junto à nossa tenda, montada ao lado de um lago, no meio de montes verdejantes, ovelhas que pastam, mosquitos que esvoaçam, e ribeiros de água que correm em direcção ao lago mais próximo. O sol, fiel companheiro durante o dia, está quase a esconder-se atrás de uma montanha. Não há um sinal de presença humana, excepto uma cerca próxima. Tem sido assim nos últimos dias na Gronelândia.
Hoje de manhã, acordamos na margem de uma baía junto a Tasiusaq, repleta de pequenos icebergues, de onde retirei o gelo para fazer o chá da manhã. A noite foi um pouco fria, mas sem chuva ou vento. Esta manhã temos planeada uma caminhada para ver a frente do glaciar que liberta todo este gelo. É um percurso não muito difícil, quase sempre seguindo o recortado do fiorde, mas o problema é que não temos muito tempo, pois às 12.30h temos de estar de volta para uma volta de kayak na baía, por entre os icebergues. Este tipo de meio de deslocação teve origem nos povos nativos da Gronelândia, por isso é adequado que o façamos aqui, embora por motivos recreativos.
Saímos só às 8.00h, pois o cansaço não facilitou o levantar do saco-cama, por isso era preciso andar de forma rápida e constante, pois a duração do trek era 4-5 h. Durante o percurso fomos passando por sucessivas baías, com cada vez mais e maiores icebergues, das mais diferentes formas e tons de azul. O miradouro para ver o glaciar parecia sempre iludir-nos. Sabíamos que era no colo entre 2 montanhas, mas quando subíamos a um ponto alto, havia sempre uma colina mais alta à nossa frente.
Apesar do tempo escassear, teimamos em seguir em frente e finalmente, com 2.15h de caminho, pudemos vislumbrar ao fundo o glaciar a descer em cascata do manto de gelo e à sua frente um imenso mar (fiorde) repleto de gelo e icebergues que cobriam toda a superfície da água.
Nesta zona, teria sido interessante aproximarmo-nos mais e até poderíamos ver outro glaciar próximo, mas o nosso tempo estava esgotado. Tínhamos de regressar o quanto antes para estarmos de volta a Tasiusaq a tempo do kayak. Regressamos, sempre a andar, quase sem tirar fotos (o que aborreceu, e muito, a Carla!) e chegamos a tempo.
Tínhamos combinado com a empresa espanhola Tarmisiut Expeditions, em Qassiasurk, e a guia já nos esperava junto a uma enseada perto da nossa tenda. Depois de uma breve explicação e de vestirmos o vestuário adequado, lá fomos nós, juntamente com um casal italiano e duas guias. O percurso é feito lentamente e conforme progredimos, os icebergues vão sendo mais imponentes e bonitos.
Temos de manter sempre uma distância de segurança, pois se um icebergue parte, pode virar-se e cair em cima de um kayak mais aventureiro, ou então as ondas resultantes podem virar o kayak. Mas seguimos sempre o exemplo das guias e desfrutamos em segurança de um cenário absolutamente fabuloso. Era uma perspectiva do gelo que nos faltava…
Regressados do kayak, não era tempo de descanso! Desmontamos a tenda, comemos o almoço (pão, queijo e chouriço) e partimos para a última caminhada do dia, em direcção a Nunataaq, uma quinta próxima, também nas margens do fiorde.
O percurso custou-nos pois já estávamos cansados e tínhamos as mochilas às costas, mas a beleza da paisagem aliviava um pouco a carga. Rodeamos a baía, aos altos e baixos, seguindo o percurso marcado nas rochas e ao fim de 1 hora e meia chegamos: a visão de 3 casas indicava que era Nunataaq.
O único habitante que vislumbramos escondeu-se dentro de casa quando nos viu ao longe. Os seus cães (amistosos) foram os únicos que vieram dar-nos as boas vindas. Como no dia seguinte partiríamos de um ponto mais à frente, subimos a estrada até encontrarmos um bom sítio para acampar (fora da zona de campos cultivados) e recolher água para cozinhar. E é aqui que me encontro.
O sol fez a sua despedida e o frio está a instalar-se. Está na altura de recolher à tenda e ao saco-cama. Amanhã, temos mais montes, ovelhas e caminhada pela frente. E sem pessoas. A Gronelândia é assim…
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