Viagens
A Rota Verde, de Freiburg a Colmar
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O arco-íris na rua da Gare em Breisach |
Sou o tipo de viajante que efetua um planejamento cuidadoso para cada dia do roteiro que percorre. Para o caso de Freiburg, onde passaria três dias, já tinha a divisão: um dia para a própria cidade (relatada no último post), um para o sul da Floresta Negra (no penúltimo post) e o último para conhecer Basileia, cidade suíça na fronteira com a Alemanha. Infelizmente nesse dia a mãe natureza tinha outros planos - amanheceu chovendo cântaros em Freiburg com a chegada da frente fria, e a situação era a mesma em Basileia. Após algum tempo, resolvi acessar a internet para verificar se alguma localidade turística ao alcance do Regiokarte (o passe regional de Freiburg) estava com uma previsão de tempo mais benigna. Breisach, no fim da linha de trem S-Bahn, estava com a chuva parando. Dirigi-me à estação ferroviária e rumei para lá. Cheguei a Breisach quarenta minutos depois, e a chuva tinha realmente cessado. Ao sair da gare, uma surpresa: um ônibus virou a curva e parou à minha frente, com o destino no letreiro: "Colmar". Já tinha lido sobre a fantástica cidade alsaciana e nem tive dúvidas - embarquei no ônibus. O motorista me entregou um folheto explicando que o trajeto Freiburg-Colmar faz parte da chamada
Rota Verde, circuito turístico entre Alemanha e França, e a saída do ônibus é sempre casada com a chegada do trem a Breisach. Todo o trajeto entre Freiburg e Colmar leva hora e meia. O trecho por ônibus custou € 7,70 , incluindo ida e volta.
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Atravessando a fronteira no rio Reno |
Assim que saimos de Breisach, o ônibus cruzou o Reno e a fronteira entre Alemanha e França, entrando na Alsácia. Três quilômetros adiante, em meio aos campos, apareceu nova surpresa: a inquietante cidade de Neuf Brisach - "Nova Breisach" em francês. O ônibus atravessou um portão numa muralha antiga bem reforçada e adentrou a cidade; passou por três quarteirões e chegou à praça principal, enorme para a cidade minúscula; contornou a praça, voltou pela mesma rua e saiu pelo portão pelo qual tinha entrado. Descobri posteriormente que Neuf Brisach é uma cidade construída como fortificação para defesa da França. Foi projetada no final do século XVII por Vauban (cujo nome já apareceu neste blog no post sobre Luxemburgo) a mando do rei Luís XVI, em resposta à perda recente do território de Breisach para os Habsburgo. A cidade é totalmente contida numa muralha dupla em formato de estrela octogonal, com as ruas dispostas em tabuleiro de xadrez. O formato da muralha de cinco metros de altura, aliado à presença de valas que a circundam, tornou a cidadela inexpugnável. Sua construção é tão original que Neuf Brisach foi declarada Patrimônio da Humanidade pela Unesco há poucos anos.
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Vista aérea de Neuf Brisach - Fonte: Wikipedia |
Após Neuf Brisach, viajamos pelos campos verdejantes da Alsácia, atravessando algumas vilas pelo caminho. A maioria possui nome alemão, como Andolsheim e Widensolen , revelando a influência germânica na região. A ocupação mais recente pela Alemanha ocorreu entre 1871 e o final da Primeira Guerra, quando pelo Tratado de Versalhes a Alsácia-Lorena foi devolvida aos franceses.
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Prédios no centro de Colmar |
Colmar é a terceira cidade da Alsácia em população com 65.000 habitantes, após Strasbourg e Mulhouse. É também conhecida como a capital alsaciana do vinho. Como toda a Alsácia, sua história é bastante atribulada. Fundada no século IX, foi alçada a cidade imperial em 1200, caindo sob o jugo sueco em 1632 e finalmente passando ao domínio francês três anos depois.
Ao chegar a Colmar, a melhor parada para soltar do ônibus é a do Teatro, a penúltima do trajeto. Como não tinha me preparado, segui as indicações até o escritório de turismo, atrás da Place d'Unterlinden. A simpática atendente me deu um folheto excelente, que continha um circuito para se seguir a pé, passando pelos principais marcos da cidade.
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Balcão da Maison Pfister à esquerda e lateral da Catedral ao fundo |
A cidade antiga é bem extensa, sendo considerada a mais bem preservada da Alsácia, com uma arquitetura riquíssima. Suas casas medievais ou da época da Renascença seguem o chamado estilo alsaciano, com as paredes contendo molduras de madeira que se cruzam, bastante similares ao estilo enxaimel alemão, mas bem mais coloridas. O melhor é seguir o roteiro indicado e apreciar os detalhes das ruas e construções do caminho , adornadas com algumas surpresas como janelas ou portas com desenhos cavados variados.
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Fonte Schwendi em Colmar |
Dentre os locais de interesse, cito a Catedral gótica de St. Martin e a Maison Pfister, uma. casa algo soturna em pedra e madeira com uma fachada impactante no estilo renascentista, erigida no século XVI. Pelo caminho, impressiona a quantidade de pequenas praças e fontes existentes, dos quais uma das mais bonitas é a Fonte Schwendi (foto acima), cuja estátua celebra o plantio de uvas originárias da Hungria nos vinhedos da região.
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Petite Venise |
A principal atração da cidade é o bairro de Petite Venise (Pequena Veneza), assim chamado devido ao rio Lauch que o cruza. Colmar é cortada por alguns canais, sempre ladeados por flores, podendo-se tomar um barco e fazer um pequeno cruzeiro por eles. O nomes das ruas neste trecho do centro lembram profissões dos seus habitantes de outrora, como a Rue des Taunners (curtidores de pele) e a pitoresca Quai de la Poissonnière (peixaria), outro cartão postal famoso pelas suas construções.
Seu principal museu é o Unterlinden, junto ao Teatro, ocupando um antigo convento dominicano do século XIII, que deve ser visitado. O acervo contém desde arte sacra , objetos arqueológicos e armaduras até mobília e prataria. Seu maior destaque é o dramático retábulo Issenheim, pintado em 1515.
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A Quai de la Poissonnière |
De volta a Breisach e à Alemanha no final da tarde, me dediquei a caminhar por esta interessante cidade histórica, localizada na encruzilhada entre Floresta Negra e Alsácia. Seu nome tem origem celta, sendo a localidade referenciada em documentos que remontam ao século IV. Posteriormente cidade livre imperial, caiu algumas vezes sob domínio francês, florescendo nessas ocasiões.
Ao passearmos pela cidade de 14.000 habitantes, não se pode imaginar que foi quase toda destruída na Segunda Guerra Mundial. Às margens do rio Reno, é dividida em cidades alta e baixa. O escritório de turismo fica situado na praça principal da cidade baixa, Marktplatz, a uns quinhentos metros da gare, e lá peguei o mapa com as indicações de caminhadas mais interessantes, seguindo o que havia feito em Colmar.
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Tomada a partir da praça principal de Breisach, com a Catedral de St. Stephan sobre o casario |
A ladeira que ali se inicia e une os dois níveis de Breisach separa o moderno e o antigo: ao se passar pelo vão da torre Hagenbach (cujo nome vem de um preso lá trancafiado no século XV), já se nota a diferença - a cidade alta retém um ar de muita tranquilidade com suas ruas de paralelepípedos quase desprovidas de automóveis e seus prédios históricos. Destaca-se a Catedral de St. Stephan, concluída no século XV, com seu tríptico cavado em madeira no altar, de 1526. Do pátio da igreja de estilo gótico e romanesco se tem vista ampla da cidade, do rio e dos campos além, sendo especialmente bela ao cair da tarde.
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A cidade de Breisach vista do pátio da Catedral de St. Stephan |
Final da história? De volta a Freiburg, a chuva e o frio voltaram e me acompanharam até a saída da Alemanha dois dias depois, não me restando alternativa a não ser visitar museus em Frankfurt. Mas isto já é assunto para algum outro post...
* Este é o último de uma série de sete posts sobre Baden, Alemanha.
Para visualizar os demais, acesse Tour pelo sudoeste da Alemanha.
Postado por Marcelo Schor em 01.06.2012
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