Vale Sagrado Inca: Pisac e Awana Kancha
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Vale Sagrado Inca: Pisac e Awana Kancha



O Vale Sagrado cortado pelo Rio Urubamba e emoldurado pelos picos andinos nevados ao fundo

          Já quase totalmente recuperado do soroche, deixei Cusco rumo ao Vale Sagrado, que percorreria em detalhe nos próximos dois dias. A maior permanência no Vale Sagrado foi o diferencial para eu ter escolhido o roteiro que adquiri. Estava ansioso para iniciar as visitas às ruínas incas, ainda mais depois de não ter podido apreciar Sacsayhuamán no dia anterior. 

O mapa do Vale Sagrado, cortado pelo Rio Urubamba (Vilcanota) - fonte: cuscoperu.com

         Agora éramos somente cinco além da excelente guia Araceli (não sei se a grafia é essa, mas vou adotá-la). Além de mim, uma moça mexicana que tinha participado do city tour de Cusco e três suíços que falavam entre si aquele dialeto do alemão que é incompreensível mesmo para quem conhece algo do idioma germânico. Como o número de excursionistas era pequeno, uma van substituiu o ônibus usado em Cusco. Engraçado, a maioria das pessoas que visitam a região ou ignoram o Vale Sagrado ou o visitam em excursões de  bate-volta a partir de Cusco, da mesma forma que vão e voltam de Machu Picchu no mesmo dia. Na ocasião, achei esse esquema cansativo – para mim o roteiro de três dias dormindo uma noite no Vale Sagrado e outra em Aguas Calientes antes de retornar a Cusco foi muito mais produtivo. Recomendo.

As simpáticas alpacas em Awana Kancha

          Recebi no início da viagem o boleto turístico que dá direito à entrada em sítios históricos e alguns museus de Cusco e do Vale Sagrado. A cada novo lugar que visitaríamos nos próximos dois dias, o boleto era exigido. Os demais integrantes o haviam recebido no dia anterior; como não pude ir a Sacsayhuamán, a guia o havia guardado para mim. Nas agências de Cusco o boleto integral custa 130 soles, e o específico para o Vale Sagrado, 70 soles,  não incluindo o traslado aos locais, só a entrada.

         A van seguiu pela estrada sinuosa e razoavelmente conservada, passando inclusive por Sacsayhuamán. Nossa primeira parada foi em Awana Kancha, um centro de exibição situado a 24 quilômetros de Cusco. Lá pudemos travar contato com os animais típicos dos Andes, como lhamas e alpacas. Animais dóceis, estavam dispostas em cercados e pudemos tocá-las e alimentá-las. Vicunhas e guanacos, mais selvagens, pastavam a uma distância maior. 

Em trajes típicos, uma senhora apresenta o processo de tingimento dos tecidos

         Numa outra seção, vimos mulheres vestidas nos trajes típicos andinos tecendo as lãs retiradas dos animais. Esta atividade é a fonte de sustento de várias famílias na comunidade. O mais interessante foi apreciar o processo de tingimento do tecido, sendo mergulhado em potes com as tinturas retiradas de plantas locais. De longe, a impressão é que um espaguete colorido está sendo cozido.

Uma tecelã e sua confecção

         Araceli ainda nos mostrou alguns exemplares das centenas de variedades de batata e milho disponíveis no Peru (confira o post sobre Lima para ver a diversidade de batatas flagrada num supermercado de Miraflores). Impressionante, eram espigas com grãos de tamanhos e cores variadas, desde o vermelho até o preto. Até espigas bicolores existiam. Na minha ignorância culinária, até então pensava que espigas de milho não escapavam da tonalidade amarelo-laranja existente no Brasil. 

         Como não podia deixar de ser, a visita terminou na lojinha do lugar, onde são vendidas as roupas de lã. De ótima qualidade, são muito bonitas... e caras.

Nossa guia mostra os inúmeros tipos de batata e milho cultivados no Peru

         Mais adiante, paramos num mirante para apreciar a vista do Vale Sagrado, um vale verde e fértil cortado pelo rio Urubamba, que desce da região de Cusco e Machu Picchu rumo ao Amazonas. O rio também é chamado de Vilcanota ou Vilcamayu, significando "rio sagrado" em quéchua, o que corrobora a denominação do vale. A partir daí, de vez em quando vislumbrávamos os picos nevados dos Andes, o que só contribuía para aumentar a beleza da paisagem.

      Sete quilômetros após Awana Kancha, chegamos à principal atração do dia, Pisac, com  10.000 habitantes. A Pisac original foi povoada no século X e era um centro importante na época inca. Inicialmente paramos para conhecer o famoso mercado local, que ferve de gente e de barracas aos domingos, terças e quintas. O mercado ocupa alguns quarteirões entre a rua e a praça principais. Como era uma manhã de segunda, o mercado estava bem vazio, mas havia várias barracas montadas, vendendo todo tipo de artigos e lembranças. Algumas lojas de artesanato na entrada da rua complementam o conjunto. Achei engraçado os suíços se espantarem com a informação de que todo dia os vendedores tinham que desarmar as barracas, e lembrei imediatamente das feiras livres brasileiras.  Depois de mais de uma hora, rumamos para a cidadela de Pisac. Mercados não são o meu tipo favorito de atração; se estivesse sozinho, minha estadia lá não teria passado de dez minutos.

Os belíssimos terraços abaixo das ruínas de Pisac

          Uma coisa que achei bem interessante na organização do roteiro foi o grau crescente de dificuldade na ordem das escaladas nas ruínas: Pisac, Ollantaytambo e Machu Picchu. As cidades do Vale se situam numa altitude bem menor que Cusco (uma média de 2.800 metros contra os 3.400 de Cusco), o que faz com que a sensação horrível de cansaço e lerdeza diminua bastante. Porém as ruínas se situam nas encostas das montanhas em locais altos, e normalmente as melhores vistas são alcançadas após vencermos centenas de degraus de escada de pedra irregulares. Com isto, a vantagem da altitude menor é devidamente anulada. E olhem, nunca subi tantos degraus desde a minha visita às ilhas gregas de Rodes e Symi.

Outra vista dos terraços agrícolas de Pisac

         A cidadela de Pisac está incluída no boleto turístico, e está situada sobre uma garganta do vale, proporcionando uma vista magnífica. A localização era proposital, já que uma das suas funções era de vigilância. Aqui encontramos ruínas de edifícios militares, residenciais e religiosos, incluindo um macabro cemitério de múmias na encosta. Pisac só confirma a perícia dos incas em construir nos lugares mais inóspitos.

       O primeiro destaque enquanto caminhávamos foram os terraços agrícolas abaixo da cidadela, cujas curvas formam belos desenhos. Estas curvas lembram a figura de um pombo, que é precisamente o significado de Pisac em quéchua. Os incas traziam terra fértil de altitudes inferiores para constituir os terraços, fonte de sustento da cidade e da fortaleza.

O Vale Sagrado visto por entre as pedras dos muros de Pisac

          Caminhos íngremes e muitos degraus levam à principal parte das ruínas, o Templo do Sol. Araceli, com a sua experiência, parava em pontos estratégicos para recuperarmos o fôlego e nos explicava os pormenores e função de cada área - o Templo do Sol, por exemplo, tinha uma função astronômica, atividade bem desenvolvida entre os incas, como comprovaria mais tarde na visita a Machu Picchu. Mas sem dúvida o que me chamava a atenção eram as pedras utilizadas nas construções, formando um mosaico magnífico, completamente diferente do trabalho nas edificações de Cusco, notadamente Qorikancha. Ainda assim, dava para reconhecer o trabalho inca nos pontos em comum, como a presença dos trapézios nas paredes (veja a foto acima) que incrementavam a resistência aos terremotos.

Casa na porção superior das ruínas incas

         Pisac foi destruída pelas tropas de Pizarro - sempre ele! - e quarenta anos depois a nova cidade (a que conhecemos atualmente) foi erguida a alguns quilômetros por volta de 1570.

           Impossível não nos maravilharmos com a engenhosidade inca. E Pisac era só um aperitivo para o que nos aguardava em Ollantaytambo e Machu Picchu.

A área do Templo do Sol em Pisac

      O almoço do dia, incluído no pacote, foi na localidade de Yucay, no restaurante do hotel Sonesta. Como já era bem tarde, nos fartamos com o bufê bem gostoso, com o apetite aumentado depois da caminhada em Pisac. De brinde, o hotel ocupa um antigo mosteiro do século XVIII e as mesas na varanda do restaurante ficavam diante de uma igreja com uma bela fachada em estilo colonial. Aliás, a localização privilegiada seria uma constante nos nossos almoços no Vale Sagrado.

A igreja diante do restaurante em Yucay

       Pernoitei em Urubamba, capital da província, já a 76 quilômetros de Cusco. O hotel San Agustín está situado na rodovia de acesso à cidade, e quem deixa a estrada ultrapoeirenta e de casebres pobres para adentrar o hotel não pode imaginar a bonita arquitetura da construção, incluindo um jardim e piscina. O hotel, um três estrelas adequado, ficava a 1,5 quilômetro de Urubamba, mas não me animei a conhecer a cidade naquele dia. Estava admirando a tranquilidade do lugar quase deserto naquele fim de tarde quando o hotel foi literalmente invadido por uma excursão escolar com dezenas de adolescentes e pré-adolescentes. Não é preciso dizer mais nada - o silêncio evaporou até o meio da noite...

          No próximo post, outras atrações do Vale Sagrado - Moray e Maras.

* Este é o quinto post da série sobre o Peru. Para visualizar os demais, acesse  Rumando ao Peru, a Terra dos Incas.


          Postado por  Marcelo Schor  em 14.04.2014 



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