Tenho 4 horas de viagem pela frente. O autocarro segue pela ruta 40, a estrada mais importante da Argentina, que liga a Terra do Fogo ao norte, na fronteira boliviana. Digijo-me para San Rafael, outra das cidades da província de Mendoza. São cerca de 300km e decidi, em vez de apanhar o transporte público, fazer um tour até ao canhão de Atuel. O autocarro cruza de forma monótona as planícies desérticas do centro argentino. O oásis vinícola de Mendoza ficou para trás e, tirando o oásis de San Carlos, o resto da paisagem é desoladora. Durante algum tempo consigo ver do lado direito os Andes mas, também eles acabam por desaparecer. Vou cochilando. A paisagem é demasiado monótona e eu adormeço.
Pelo caminho ainda atravesso a reserva natural de
Sierra de las Quijadas e consigo ver duas vicunhas.
É quase meio-dia quando o autocarro pára no miradouro do canhão. O rio Atuel talhou um canhão relativamente profundo e estreito ao longo de 67km. Esta obra da natureza permitiu colocar a descoberto camadas sucessivas de materiais rochosos e sedimentos distintos fazendo deste percurso uma autêntica viagem
verniana ao centro da Terra.
Enquanto penetro o interior do canhão por estradas de terra batida que serpenteiam as suas vertentes abruptas, Elisa, a guia, vai explicando aquilo que vou vendo. Apesar de não ter formação em geografia ou geologia, Elisa é extremamente informativa e é uma amante da beleza singular deste local. Vai alertando para as mil e uma formas ímpares por que passamos e, inclusive, mostra-nos discordâncias na forma como os materiais estão ligados devido aos movimentos tectónicos e posteriores deposições. Enquanto ouvia as suas explicações sentia-me quase numa visita de estudo.
O canhão de Atuel apresentou em tempos uma vigorosidade muito maior. Face a um desnível de 450m, o governo argentino decidiu criar um conjunto de barragens que permitem a produção de energia eléctrica. Hoje existem 4 barragens nesta secção do Atuel, sendo que a última criou uma albufeira de beleza invulgar, cujo aproveitamento para turismo de aventura permitiu dinamizar a região. São várias as ofertas aos visitantes: rafting, canoagem, tirolesa, btt e orientação. Estas atracções parecem dinamizar mais o turismo nacional do que o estrangeiro, o que não deixa de ser curioso. Aproveito para almoçar algo num restaurante. Junto-me a um casal neo-zelândes e 3 italianos que vivem na Suiça. Conversamos, partilhamos experiências de viagens, dicas, etc. Um casal argentino foi fazer tirolesa e duas dinamarquesas de meia-idade aguardam sentadas na margem da albufeira.
São horas de regressar. Voltamos à ruta 40 por mais 4 horas. Mais uma vez tenho a noção da dimensão deste país. São quase 22h quando chego a Mendoza.