Fundada em 1724 e hoje com 1,3 milhão de habitantes, Montevidéu é a cidade com melhor qualidade de vida da América Latina. A capital do Uruguai soube como conservar a sua história. Seu centro, composto pela Cidade Velha e por uma parte mais nova, está repleto de construções históricas que são um deleite para os olhos, especialmente alguns exemplares de prédios em estilo art-déco do início do século XX. As várias praças arejam a região e seus quiosques verdes sempre presentes lhes dão uma aparência ainda mais pitoresca.
Tendo me hospedado no bairro litorâneo de Pocitos (acesse aqui o post sobre a orla), tinha condução fácil para ir ao Centro, através das linhas de ônibus 116 e 121 - esta última faz um trajeto ligeiramente mais longo. A linha 121 acompanha toda a Avenida 18 de Julio, a principal do centro, e passa pela esquina da Calle Tristán Narvaja , conhecida por sua feira dominical de quinquilharias. Este não é um programa que me atrai, mas da janela do ônibus fiquei admirado com a quantidade de gente que percorria a feira naquela manhã. Durante minha visita posterior ao Teatro Solis brasileiras comentavam que ficaram admiradas com o estado de alguns artigos que estavam sendo oferecidos na feira.
O prédio da
Intendencia (a Prefeitura de Montevidéu) ocupa dois quarteirões na Avenida 18 de Julio, com uma rua atravessando a construção, e conta com um mirante no 22° andar, com entrada gratuita. Havia lido que era necessário obter o ingresso no escritório de turismo da cidade, localizado no largo em frente, mas a atendente do escritório me informou que este procedimento não era mais necessário. Para chegar ao terraço, é necessário descer ao subsolo e no final do corredor pegar o elevador panorâmico. Pela sua posição estratégica, o terraço tem vistas para os quatro cantos de Montevidéu, com placas detalhando os marcos da cidade na paisagem.
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O centro de Montevidéu visto do terraço da Prefeitura |
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Avenida 18 de Julio é a principal do centro de Montevidéu, se estendendo por mais de três quilômetros a partir da Plaza Independencia. A data homenageia a promulgação da primeira constituição uruguaia em 1830, dois anos após ter se libertado do Brasil. O trecho entre esta praça e a Intendencia é o mais percorrido pelos turistas, por concentrar praças e prédios interessantes. É na 18 de Julio que se concentram também lojas de câmbio com taxas atrativas. Percorri a avenida em dois dias distintos - num domingo, quando estava fechada ao tráfego, e na segunda, dia útil. Preferi o visual de domingo, mais relaxado, com o tráfego pesado dos dias úteis substituído por caminhantes.
Andando na direção da Cidade Velha, dois quarteirões após a Intendencia, vemos a
Fonte dos Cadeados, onde os casais apaixonados deixam seu cadeado e jogam a chave fora com vistas ao amor eterno. Com um espaço disponível muito menor que as pontes com finalidade idêntica como a Pont des Arts em Paris, esta fonte está tão abarrotada que os cadeados ficam pendurados um nos outros, formando um conjunto curioso que de longe lembra uma vegetação.
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A Fonte dos Cadeados |
A coluna de mármore que divide a 18 de Julio ao meio na Plaza Cagancha é conhecida como a
Coluna da Paz. A coluna serve como marco zero para medição de quilometragem das estradas uruguaias. A estátua ostenta nas mãos uma bandeira e uma espada em riste. Confesso que não entendi a relação entre a espada e a paz. De qualquer forma, a espada já foi retirada uma vez do conjunto, mas voltou muitos anos depois.
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A Coluna da Paz na Plaza Cagancha em plena Avenida 18 de Julio fechada ao tráfego no domingo |
A seguir, se chega à Plaza Fabrini, mais conhecida como
Plaza del Entrevero, nome da escultura em bronze que domina a praça, evocando as lutas nos tempos coloniais . Como a maioria das áreas verdes de Montevidéu, é muito bem cuidada. O casarão de três andares do final do século XIX na esquina da 18 de Julio é o
Palácio Heber Jackson, que sedia dois museus gratuitos, o Museu do Gaúcho, dedicado ao habitante típico dos pampas, e o Museu da Moeda. Aliás, um dos aspectos mais simpáticos da capital uruguaia é a disponibilidade de muitos museus com entrada franca, especialmente no centro da cidade.
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A Plaza del Entrevero e atrás do monumento, o Palácio Heber Jackson |
O edifício situado na esquina da 18 de Julio com a Plaza Independencia é o prédio mais icônico de Montevidéu, o
Palácio Salvo, mostrado na foto que abre o post. Inaugurado em 1928, é um exemplo fabuloso de estilo art-déco, com 28 andares de escritórios. Na época era o edifício mais alto da América do Sul. A torre impressionante do Palácio Salvo me lembrou um foguete espacial, o que não deixa de ser surpreendente dado o ano de sua construção. No terreno em que foi erguido se localizava anteriormente um bar, onde em 1915 foi composta a obra-prima do tango uruguaio,
La Cumparsita. E se você tem a impressão de já ter se deparado com um prédio parecido em viagem anterior, existe o Palácio Barolo na Avenida de Mayo em Buenos Aires, projetado anos antes pelo mesmo arquiteto. Atualmente há um tour guiado de 90 minutos incluindo vista do mirante situado em um dos andares mais altos. Não fiz o tour, já que é oferecido somente às terças, quintas e sábados à tarde, mas de qualquer forma creio que acharia a vista pior do que a da Prefeitura, pelo simples motivo de o próprio Palácio obviamente não estar incluído nela. Aliás, a beleza do Palácio Salvo é realçada ainda mais pelo contraste gritante com o feioso e monstruoso Edifício Ciudadela, do outro lado da praça.
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A estátua do General Artigas e parte do Edifício Ciudadela à esquerda |
Se a Plaza Cagancha é o quilômetro zero rodoviário, a
Plaza Independencia é o coração real do centro. Dominando a praça está a
estátua do General Artigas, considerado o grande artífice da independência uruguaia, apesar de esta ter sido proclamada oito anos depois de Artigas ter sido exilado no Paraguai após perder uma batalha decisiva para tropas luso-brasileiras. Abaixo da praça fica o seu mausoléu, onde repousam suas cinzas sempre guardadas por dois soldados. Nas paredes ao redor constam inscrições lembrando os principais eventos históricos de que participou. A entrada no mausoléu também é gratuita.
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O Mausoléu de Artigas |
A praça ainda reserva mais construções interessantes. Um exemplo é o
Palácio Estevez, a algo acanhada sede em estilo neoclássico do governo uruguaio por mais de cem anos até 1985, quando o poder executivo se mudou para a moderna (e bem maior) construção ao lado.
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Palácio Estevez, antiga sede presidencial |
A poucos passos do Palácio Estevez e já um pouco fora da praça, o
Teatro Solis é o teatro principal do Uruguai, inaugurado em 1856. O tour por suas dependências está disponível diariamente em horários específicos, exceto às segundas, e essa foi a razão principal de eu ter incluído uma visita ao centro também no domingo. Os grupos são divididos por idioma (por sinal o grupo em português era o mais numeroso). Ao comprar o ingresso na bilheteria me dirigi ao funcionário em português e ele me cobrou 60 pesos. Consultando posteriormente o site do teatro, descobri que foi um erro: o tour em espanhol custa 40 pesos, menos que em inglês e português. Como domino bem o idioma de Cervantes, morri em 20 pratas à toa...
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A fachada do Teatro Solis |
O guia vai percorrendo os ambientes do teatro, explicando sua história e funcionalidades. A fachada já impressiona com as colunas gregas e o sol sobre elas, símbolo presente na bandeira uruguaia. O destaque vai mesmo para a sala principal de espetáculos com o lustre enorme no teto e os camarotes em quatro andares em semicírculo sobre a plateia, incluindo o presidencial e o do prefeito. Durante o tour, uma dupla de atores com cara pintada apareceu algumas vezes interrompendo as explanações do guia, fazendo pantomimas e pequenas apresentações cômicas. Coitado do guia, após uma dessas interrupções desnecessárias até se esqueceu do que estava falando... O tour termina na segunda sala de espetáculos, uma arena bem menor em área. Sem dúvida, bem melhor que fazer o tour é assistir a uma ópera ou concerto nesta magnífica casa de apresentações. Consulte a programação e horários de visita em www.teatrosolis.org.uy.
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A sala principal de espetáculos, com o lustre refletido sobre o camarote presidencial |
Mas a construção mais antiga da Plaza Independencia é mesmo a
Porta da Cidadela, o único resquício ainda em pé da antiga muralha que cercava a cidade velha de Montevidéu, posta abaixo em 1829. A Porta se situa em frente ao início da
Peatonal Sarandí, a rua de pedestres que corta a cidade velha.
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A Porta da Cidadela e a Plaza de Independencia, com um dos onipresentes quiosques |
Para entrar no clima da Cidade Velha, basta percorrer os quarteirões da Peatonal Sarandí e as ruas ao redor. Esta é uma área que alterna construções recuperadas com outras bem maltratadas, mas com muitas fachadas trabalhadas características de prédios antigos.
Logo no início da rua fica o
Museu Torres García, com quatro andares dedicados a um dos maiores expoentes da pintura uruguaia. Mais um quarteirão e alcançamos a
Plaza Matriz, a praça mais antiga da cidade, ladeada por duas construções reminiscentes da época colonial: a
Catedral Metropolitana, inaugurada em 1804 e local do juramento da primeira Constituição (e por essa razão, a praça também tem o nome de Plaza de la Constitución) e o
Cabildo, sede administrativa da colônia e dos primórdios da república, que estava em reforma durante minha visita.
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Plaza Matriz e a Catedral de Montevidéu |