Ao lado do magestoso Palácio do Governo fica um dos maiores bairros de lata da cidade. Diana, a minha
host (de couchsurfing) salienta: "Para que el presidente no se olvide de que su gente tiene hambre.". Estas palavras marcaram-me. É a realidade paraguaia. O povo, na sua maioria, tem fome e passa inúmeras dificuldades.
O salário médio no país é 300USD/mês e Diana, professora de música, tem que fazer 50 horas por semana para conseguir este salário. Daniel, o seu amigo, com o qual partilhamos uma noite de conversa na esplanada de um bar, é professor de economia. Para conseguir fazer 350USD/mês trabalha de manhã numa escola do estado, de tarde noutra e à noite num colégio privado. Todos os dias das 8h às 22h. Não há dias livres, não há tempo livre e ainda há o trabalho burocrático para fazer em casa. Perguntam-me quanto ganha um professor em Portugal. Tenho vergonha e minto. Digo, 800€. Ficam escandalizados. Tanto dinheiro e apenas 35 horas semanais. Aqui seriam ricos. Sinto-me mal pela mentira.
Conversamos sobre a situação politico-económica do Paraguai. Queixam-se da presença norte-americana, cada vez maior. Os EUA têm aqui a segunda maior embaixada do mundo. Segundo Daniel, tudo tem a ver com o aquífero do Guarani, a maior reserva de água doce subterrânea do mundo, que o Paraguai divide com o Brasil e parte da Argentina. Dizem por cá que a embaixada tem bunkers e muito armamento. Ao que parece é uma cidade dentro da cidade.
No passeio que demos à noite pela capital mostram-me com orgulho os edifícios históricos da cidade. No entanto, nenhum tem mais de 150-200 anos. Independente desde 1811 (faz este ano 200 anos), tudo o que havia da época colonial foi destruído durante a Guerra Grande (Guerra da Tripla Aliança), a guerra do Paraguai contra a Argentina, Brasil e Uruguai, em 1865-70, quando o país perdeu 80% da sua população e a maioria das infraestruturas. Seguiram-se vários conflitos com os países vizinhos e uma ditadura de 35 anos que só viria a terminar em 1989. A democracia no Paraguai tem pouco mais de 20 anos e neste curto período não se pode esperar que se altere tudo.
Assunção parece ser o retrato de um país. No entanto, nas visitas que efectuei aos diferentes museus da cidade, pude aperceber-me que grande parte do país é ainda mais remoto.
Há áreas que não são servidas por transportes públicos, há indígenas na floresta sem qualquer contacto com aquilo que chamamos de "civilização". As áreas mais inóspitas são pouco conhecidas e não há certezas sobre a população que as habita. O Museu Etnográfico André Barbero e o Museu do Barro espelham muito bem esta situação, reunindo colecções muito interessantes sobre arte e cultura indígena, desde a região da selva paraguaia, junto ao rio Paraná, até Chaco, a região mais inóspita do país.
Paraguai significa, em guarani, "de um grande rio" e o seu nome provém do próprio rio Paraguai que divide o país a meio. Hoje é considerada a capital do contrabando da América Latina e os turistas fogem do país. Está na rota do tráfego de droga internacional e é um dos maiores produtores de marijuana do mundo.
Embora Assunção seja uma cidade feia, sem grandes atractivos, a verdade é que para mim esta visita foi extremamente interessante. Aprendi, partilhei, e valorizei a vida, mais do que em qualquer outro lugar da viagem.