As muitas faces de Riga
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As muitas faces de Riga


A Casa das Cabeças Negras e a estátua de São Rolando

      A vontade de conhecer Riga apareceu no ano passado, quando estive em Lübeck, considerada a principal cidade hanseática alemã. Nesta ocasião aprendi ao visitar um museu que a distante cidade báltica também tinha sido um importante centro hanseático.

     Na verdade, a capital da Letônia parece duas cidades diferentes, igualmente  interessantes e apaixonantes. A primeira, situada numa ilha entre o Rio Daugava e o Canal Pilsetas, é conhecida como Riga Velha (Vecrīga em letão) e corresponde à cidade mais antiga, com construções remontando ao século XIII. A segunda, após o Canal, é a cidade do início do século XX, com quarteirões inteiros de edifícios no estilo art nouveau e que rendeu o título de ‘Paris do Norte’ a Riga, além da nomeação de Patrimônio da Humanidade pela Unesco.


Vista de Riga a partir da torre da Igreja de São Pedro. No centro, a Catedral.

       Riga é a maior cidade dos Países Bálticos, com 700.000 habitantes, cerca de um terço de toda a população letã. É um centro econômico, industrial e portuário importante, situado numa localização estratégica junto à foz do Rio Daugava no Golfo de Riga. Foi fundada em 1201 pelo bispo Albert, oriundo de Bremen, e logo se tornou uma próspera cidade da Liga Hanseática, atuando como entreposto comercial na venda para o Ocidente de peles e de outros produtos russos. Três séculos mais tarde, caiu sob domínio lituano-polonês e depois sueco, sob o qual se iniciou um período de  autonomia relativa. Em 1710, foi tomada pela Rússia e assim permaneceu até a formação da Letônia em 1918.

       Uma característica inquietante: os letões até poucos anos atrás eram minoria na sua própria capital. Hoje ainda quase metade da população é russa ou de descendência russa, consequência da deportação de letões durante a ocupação soviética e da imigração de mão de obra da Rússia durante este período, entre 1945 e 1990, além da baixa taxa de natalidade local.

Detalhe da Casa das Cabeças Negras, com o relógio astronômico

         Sua cidade histórica é dividida ao meio pela Kaļķu iela, a rua principal de pedestres. No seu final se encontra a Praça da Prefeitura (Ratlauskums), local que concentra alguns dos principais monumentos da cidade. Sem dúvida, o mais chamativo é a Casa das Cabeças Negras, uma espetacular construção de 1334 que abrigava a Confraria de Solteiros, uma instituição comum nas cidades da Liga Hanseática – depois de se casar, os mercadores se tornavam sócios da Grande Guilda, na Praça da Livônia. O nome da casa tem origem em São Maurício, o patrono da confraria, um guerreiro de origem africana. A Casa das Cabeças Negras foi arrasada por bombardeios em 1941, sendo reconstruída e reinaugurada somente em 1999. Honestamente, é uma das construções mais bonitas que já vi, com seus inúmeros detalhes na fachada, desde as várias estátuas até o detalhado relógio astronômico em azul e dourado. À sua frente, no meio da praça, a estátua de São Rolando homenageia o padroeiro da cidade.

A Prefeitura de Riga

       Em frente à Casa se encontra o prédio neoclássico da  Prefeitura, e a uma quadra de distância a gótica e luterana Igreja de São Pedro, presente desde a fundação da cidade. Ao contrário dos lituanos, os letões não professam uma fé majoritária, se dividindo entre luteranos (um terço) e católicos, ortodoxos e sem religião. Subi por um elevador à torre da igreja, que tem 123 m de altura. De lá se descortina uma vista de 360° de toda a cidade com seus telhados multicoloridos, desde o rio até a parte mais moderna do centro. Uma tradição do local é o lançamento de vidro desde o topo a cada reconstrução da torre. Quanto maior o número de cacos resultantes da queda, maior será a duração da construção. Em 1667, o vidro simplesmente não quebrou ao pousar num monte de palha, e no ano seguinte, a torre se incendiou. Após a  reconstrução da torre quando a Segunda Guerra terminou, o júbilo foi grande, pois o vidro se espatifou totalmente.

A Igreja de São Pedro 

          No pátio  lateral da Igreja se encontra a estátua em bronze dos Músicos de Bremen. A estátua, um presente da cidade irmã hanseática alemã em 1990, homenageia os quatro animais protagonistas da fábula dos Irmãos Grimm. A estátua é uma réplica da famosa escultura existente em Bremen. Repare que que os focinhos do burro e do cachorro estão desgastados, devido ao hábito de se passar a mão neles em busca de realização de um desejo.

Os músicos de Bremen 

         Voltando dois quarteirões na Kaļķu iela, chegamos à Praça da Livônia (Livu Laukums), contendo prédios do século XVIII em sequência colorida. Uma feirinha e vários restaurantes com mesinhas ao ar livre compartilham a praça. Seu prédio mais famoso é a Casa do Gato. Conta-se que um rico comerciante teve sua entrada vetada na Grande Guilda, situada em frente. Como vingança, ele postou na ponta do telhado da sua casa um gato com o rabo voltado para a Guilda. Anos depois, após uma longa batalha judicial, conseguiu sua entrada, sob a condição de desvirar o gato. Quanto ao prédio da associação, hoje sedia a Filarmônica da Letônia.

A Casa do Gato, na Praça da Livônia. Hoje o gato está de frente para a antiga sede da Guilda
A Praça da Livônia com suas barracas e prédios coloridos

          Ainda no centro antigo se destaca a Praça da Catedral. Pena que a imponente edificação estivesse em obras. A maior igreja de todo o Báltico foi construída em 1211 e mistura estilos de seis séculos, desde o romanesco inicial, passando pelo gótico e terminando no barroco de sua torre. Os vitrais em seu interior  retratam cenas da Riga medieval. Seu órgão possui 6.768 tubos e não se deve perder a oportunidade de se assistir a um concerto noturno no interior da igreja.

         As ruas no entorno da Catedral são as mais antigas da Cidade Velha. O destaque vai para a estreita e pitoresca Trokšņu iela, junto das muralhas da cidade medieval ainda existentes. É difícil imaginar que esta rua cujo nome significa "rua barulhenta" era ponto de prostituição no passado. 

A Troksnu iela e a muralha 
Canhão diante do Quartel de Jacó

       As muralhas terminam na Torre de Pólvora, a única das dezoito torres do século XIII que sobrou, e são ladeadas pelo Quartel de Jacó, cujo enorme edifício militar amarelo data do século XVI e hoje contém butiques e cafés. Alguns exemplares de canhões junto ao muro lembram o papel defensivo de toda a área no passado.

A Torre de Pólvora

      No próximo post, continuamos a percorrer Riga, focando em suas atrações mais recentes, com destaque para as maravilhosas fachadas art-nouveau.

          E se você ficou curioso em saber mais sobre a Liga Hanseática e as cidades que a compuseram, leia o post Lübeck e sua herança hanseática.

Este é o sexto de uma série de posts sobre Varsóvia e os Países Bálticos. Para visualizar os demais,  acesse Descobrindo os Países Bálticos.

  Postado por  Marcelo Schor  em 12.12.2012  




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